Do rio que tudo arrasta, se diz que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o comprimem. Bertolt Brecht
Foi ontem apresentado, com pompa e circunstância, o chamado Relatório Anual de Segurança Interna 2013, elaborado pelo chamado Sistema de Segurança Interna, que reúne tudo o que são corpos de polícia e de segurança do Estado. Do relatório cada um tirará o que quiser, segundo a sua área de interesse. Mas pelo que se refere à presença anarquista e anticapitalista em Portugal verifica-se que o trabalho de pesquisa feito retoma apenas o velho clichê de anarquismo como sinónimo de violência.
No que aos anarquistas diz respeito, constamos de um parágrafo deste relatório de mais de 400 páginas. Escreve-se neste documento policial:
Em jeito de resposta deixo aqui alguns considerandos:
1) É estranho que um relatório sobre acções violentas e actuações radicais não refira as medidas extremistas que têm sido levadas a cabo pelo governo de Passos Coelho (como outros anteriormente) e que têm significado para muitos milhares de portugueses pobreza, desemprego, despejos, sofrimento e, muitas vezes, morte;
2) É também estranho que neste relatório, referindo-se às “forças extremistas”, não se fale da actuação dos corpos armados do Estado, que na última década mataram mais de cinquenta cidadãos e foram responsáveis pela agressão e violência contra milhares de outros;
3)É igualmente de notar o facto do relatório estabelecer, sem margem para dúvidas, que anti-capitalistas, autónomos e anarquistas são sinónimos de “violentos”, o que, logo à partida, é uma completa falsidade que apenas visa, mais uma vez, tentar criminalizar os movimentos de protesto social mais radicais e menos integráveis no sistema;
4)Não deixa de ser curioso que o “establishment” policial considere que, no panorama social português, anti-capitalistas são os autónomos (não cingidos a qualquer partido) e os anarquistas, únicos com capacidade para ”infiltrarem os movimentos de contestação e criarem focos de insurreição” – e não qualquer uma das estruturas ditas de esquerda que se afirmam contra o capitalismo (partidos de esquerda ou sindicatos), mas que se limitam a ser a “esquerda” do sistema, sem a mínima capacidade de contestação ou transformação social;
5)Por último, – uma vez não é regra – esta fauna policial acerta no alvo. É verdade que, por enquanto, “anticapitalistas e anarquistas continuam a não ter capacidade de concretizar os seus objectivos revolucionários”. De facto, é por isso que batalhamos. E se já tivessemos essa capacidade outro galo cantaria e outro seria o teor do vosso “relatório”, bem mais nutrido do que agora, não é verdade?
m.a.r.